É uma boa prática de um investigador ou auditor de um processo começar
pela cronologia dos fatos. Não raras vezes essa cronologia aponta para indícios
de irregularidades.
No caso do CINE FOZ, quando, por exemplo, o autarca diz numa reunião que
uma determinada empresa, neste caso a GreenPrime, foi constituída apenas para
esta operação, de imediato vamos à base de dados pública do Ministério da Justiça
verificar quando é que a empresa foi constituída.
Acontece que a Green Prime foi constituída dois anos antes do famoso
edital, publicado de forma pouco transparente, à qual a empresa foi a única
concorrente, tendo um capital social de 100 euros e sem qualquer atividade
anterior.
Apesar disso, o Araújo fez o negócio e em público mostra saber que havia
outra empresa por trás. O Araújo fez o negócio pelo currículo da Green Prime ou
pelo conhecimento que tinha de quem estava por detrás da GreenPrime? E se um
negócio desta dimensão implica um conhecimento e confiança no interlocutor,
como é que a empresa que usa a Green Prime conquistou a confiança do autarca? E
se a empresa foi criada apenas para este negócio como é que os seus sócios a
criaram uma anos antes da publicação do edital?
Mas deixemos estas conjeturas, por mais óbvias que sejam e que por si só
geram muitas dúvidas que merecem ser investigadas, e vejamos a cronologia dos
acontecimentos, que decorre do processo do loteamento que está sob consulta
pública e a cujas cópias tivemos acesso.
Analisando o processo resultam muitas evidências:
Que o Araújo não se limitou à isenção de taxas municipais, ignorou as
compensações financeiras devidas ao Município pelo licenciamento de um projeto
destas dimensões, que, ainda por cima, ignora a traça da zona história sem
criar um metro quadrado de espaços verdes.
Pior ainda, fica a cargo do município “a
continuidade dos alinhamentos da rua 1.º de Maio”, ou seja, a expropriação dos
edifícios que vão garantir a manutenção do perfil dos arruamentos e vai
viabilizar a operação de loteamento cujo promotor é a empresa GreenPrime.
O despacho do Cipriano em relação ao PIP condiciona
a proposta constante do PIP “ao enquadramento e respetiva apreciação ao artigo
51.º do Regulamento do PPSNPVRSA”. Logo o PIP não foi deferido. Isto é, o
deferimento foi condicionado. Quem aprova o PIP na sequência de e-mail da
empresa solicitando esclarecimentos relativos ao despacho do Ricardo Cipriano
foi o Araújo que avocou o processo. Deferiu o pedido sem mais esclarecimentos.
Pior ainda, o Araújo decide que não se deve
condicionar “o desenvolvimento do loteamento a fatores paralelos” e dá, sem
mais, “sem efeito o pedido de parecer solicitado à Divisão Jurídica”,
ignorando, assim, os pareceres técnicos e o despacho do vereador Ricardo
Cipriano, datado de 31 de Agosto de 2023.
Quando entrou o pedido de loteamento, no seu
parecer a técnica Ana Ruivinho conclui que se abstém de “apreciar as demais
questões do pedido, enquanto não se reavaliem superiormente os dois assuntos
que mais suscitam dúvidas”, pelo que remete o assunto, à consideração superior.
Isto é, a técnica não se pronuncia sobre a
legalidade e o cumprimento das normas urbanísticas, enquanto o executivo não se
pronunciar quanto ao pagamento das taxas, segundo a técnica devidas, pela não
cedência de equipamentos e áreas verdes (estamos a falar de centenas de
milhares de euros) e enquanto não houver uma posição quanto à necessidade do
cumprimento do artigo 51.º do PPSNPVRSA. Todavia, o Araújo ignorou as questões
suscitadas pela técnica.
Nas reuniões de câmara o Araújo e o Cipriano
passaram sempre a ideia de que se teriam limitado a apoiar-se nos pareceres dos
técnicos, sugerindo aos vereadores da oposição que não confiariam nos serviços.
Hoje sabemos que na base dos deferimentos estão pareceres técnicos negativos
que o Araújo ignorou sem qualquer explicação técnica ou jurídica. Ainda por
cima, sobrepondo-se ao vice presidente que detém o pelouro do urbanismo,
avocando este processo.
Da intervenção do Araújo resultaram grandes benefícios para o investidor, tudo deferido contra um parecer técnico negativo e sem quaisquer explicações.