Esta semana o país pareceu surpreendido com o elevado número de casos de corrupção nas autarquias, matéria que foi notícia em consequência da publicação do relatório do Conselho de Prevenção da Corrupção:
«O Conselho de Prevenção da Corrupção analisou em 2018 um total de 604 casos relacionados com esta criminalidade: 48% ocorreram em autarquias, o que representa a maior percentagem de sempre.» (Diário de Notícias)
Apesar da aparente surpresa com que esta notícia apanhou alguns, a verdade é que estes dados pecam por escassos, quem acompanhe a realidade autárquica sabe como nalguns concelho o cheirete da corrupção até tresanda e, todavia, tem-se a impressão de que a justiça está a assobiar para o ar. Basta acompanhar as compras de muitas autarquias para percebermos que se gastam milhões e milhões de euros sem qualquer concurso, a regra são as adjudicações direta ou, o que vai dar no mesmo, as consultas.
Se somarmos o número de autarquias, (3091 juntas de freguesias e de 308 municípios) com as das empresas municipais chegamos a um número de entidades esmagador se comparado com o das instituições da Administração Pública central. A mesma relação existe se compararmos o número de empresas públicas com o de empresas municipais.
Se olharmos atentamente para as compras de um município começamos a identificar fenómenos que se repetem de concelho para concelho. Empresas que vivem quase exclusivamente de um município. Sucede muito com pequenas e médias empresas de construção civil, com especialistas me festas e festarolas e com muitos outras prestações de serviços que vão da restauração à hotelaria. A regra é a de que “são sempre os mesmos” e no concelho ao lado já são outros.
Então porque motivo temos a sensção de impunidade ao nível local? A verdade é que o combate à corrupção vem muito a reboque da opinião pública e esta reage em função da perceção, sentimento que por sua vez resulta da comunicação social. Acontece que para a comunicação social importa mais o Joe Berardo e os muitos milhões da CGD do que as traquinices corruptas de um qualquer autarca do interior ou de uma qualquer localidade afastada da capital
As notícias de terras distantes pouco mais valem do que um rodapé e apenas alguns casos chegam a ganhar uma dimensão mediáticas, Por outro lado, a comunicação social local depende da publicidade das autarquias, quando não são controladas por estas ou não fazem mesmo parte de poderes corruptos.
Também ao nível da justiça se sentem diferenças e a separação de poderes é mais nítida em relação aos governos do que muitas vezes sucede nas autarquias. Se na capital os agentes da justiça tudo fazem para “apanhar” um governante em falta, longe da capital as relações são mais simpáticas, as pessoas são mais próximas e uma boa tasca e um bom petisco pode fazer milagres com que nenhum ministro sonharia. Não admira que por vezes tenhamos a sensação de que é mais fácil a justiça perseguir um qualquer cidadão que por ter dirigido uma crítica mais rude é alvo de uma queixa por ofensas por difamação, do que uma queixa por corrupção dirigida por um cidadão dar lugar a uma investigação séria.