O CAFÉ DA CASA DA ALFÂNDEGA (2)



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Graças à intervenção da presidente da autarquia na reunião da sessão da CM do passado dia 19 e tendo em consideração os documentos tornados públicos, bem como as declarações da responsável da Grand Algarve, empresa gestora de um projeto hoteleiro que integra o edifício da Alfândega de Vila Real de Santo António estão reunidas todas as peças para se poder analisar de que forma foram utilizados fundos comunitários no edifício histórico da Alfândega de Vila Real de Santo António.

A análise de todos estes elementos permite concluir pela existência de indícios de irregularidades, porventura graves, na utilização dos recursos financeiros que a Comissão Europeia colocou à disposição da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António e da empresa municipal SGU, para recuperar o edifício da antiga Alfândega de Vila Real de Santo António.

Da leitura dos documentos e da audição das declarações da autarca pode concluir-se que:
  1. A utilização para fins turísticos do edifício da Alfândega esteve prevista desde o início do projeto "alojamento a céu aberto" que desde a divulgação do caderno de encargos não previa qualquer utilização pública ou para fins culturais. A decisão do júri data de janeiro de 2014 e o contrato com a empresa concessionária é de 2015.

  2. O edifício da Alfândega foi objeto de uma concessão para utilização turística durante 31 anos, sendo a renda de um montante de 17.160€ nos primeiros 15 anos e de 50.000€ nos 16 anos seguintes. 

  3. O site oficial do Programa2020 torna pública a utilização que vai ser dada pela Grand Algarve ao edifício da Alfândega. Numa página onde dava a notícia e fazia diversas citações de declarações do então presidente da Câmara Municipal adiantava que "em complemento ao hotel, a unidade engloba a exploração de um conjunto de suítes de luxo no edifício da Alfândega (a primeira construção da cidade), bem como um Beach Club de caraterísticas premium, localizado na foz do Rio Guadiana.»

  4. A responsável da Grand Algarve, a concessionária do edifício da Alfândega declrarou ao Público que naquele espaço iria ser o Grand Café: 

    «O grupo que investiu na recuperação do Grand House quer que este espírito contagie Vila Real de Santo António e, por isso, o projecto inclui dois outros espaços: o Beach Club, que abriu no Verão e recupera uma antiga base militar também abandonada, à beira do Guadiana; e o Grand Café, com abertura prevista para o Outono noutro dos grandes edifícios históricos da vila, o da . Alfândega, na frente ribeirinha, a dois passos do hotel. 

    Marita Barth, directora do hotel, alemã a viver no Algarve há muitos anos (e a trabalhar também há muito na hotelaria de luxo algarvia), convida-nos a espreitar a Alfândega, abrindo a grande porta com uma chave enorme, vinda de outros tempos. Central no plano do Marquês, para permitir a cobrança de impostos e combater o contrabando, a Alfândega tem a fachada principal virada para o rio e a de trás voltada para o edifício da Câmara Municipal que, por sua vez, dá para a antiga Praça Real (onde, à direita e fora deste eixo principal, surge a Igreja).

    Aqui será o Grand Café, ao estilo dos finais do século XIX, inícios do século XX, aberto à cidade. Noutra sala, na parte das traseiras, haverá uma loja com objectos de diferentes designers. E no primeiro andar pretende-se fazer nascer um clube privado, para clientes do hotel e sócios, com, exemplifi ca Marita, uma sala de cinema que pode ser usada para reuniões ou pequenas conferências e outra sala para “charutos e Porto”.»
     
  5. O contrato entre a autarquia e a empresa Grand House é claro quanto à utilização do edifício, nele não constando qualquer limitação ou condicionalismo que obrigue a a empresa a ali criar qualquer centro de interpretação do Guadiana ou qualquer outra utilização de caracter público:

    «1. A primeira contrata a Segunda, que aceita, para exploração e gestão do projeto designado por "Alojamento a Céu Aberto", o qual consistirá na exploração e gestão de três imóveis, adiante melhor identificados, com a finalidade de desenvolver um modelo de negócios que permita transformar um conjunto de imóveis sem ligação num cluster de alojamento com um conceito associado, consubstanciando a oferta de Hotéis de Charme, Hotéis Design e Apartamentos de Charme, de qualidade 4 ou 5 estrelas, que integrados formem um Resort Turístico alicerçado na História de VRSA, conforme descrito na proposta adjudicada" e o imóvel designado como "Lugar da Ponta da Areia", todos melhor identificados nas peças do procedimento."

  6. A recuperação do edifício foi feita com fundos concedidos no âmbito projeto Andabagua, fazendo parte da Prioridad 3 do Programa Operativo de Cooperação Transfronteiriça Espanha-Portugal, referente a la “Ordenamento do território y acessibilidades” na região da Andaluzia, Algarve e Alentejo, e que no âmbito da Cooperação Transfronteiriça Portugal Espanha recebeu a designação de "Territorio y Navegabilidad en el Bajo Guadiana".

  7. A atual autarca sabia dos condicionalismos na utilização do edifício em consequência de a sua recuperação ter sido feita com fundos do FEDER, sabia que o programa Algarve 2021 implicava uma utilização pública e que no quadro do programa Andalbagia Portugal com a UE o compromisso de ali criar um centro de interpretação do Guadiana. Mesmo assim e conforme declarou na reunião da câmara do passado dia 9 de Março tentou junto da CCDR Algarve poder dar uma utilização privada ao edifício, o que lhe foi recusado.
  8. A presidente da autarquia na reunião do passado dia 19 de março referiu que a CCDR já visitou o local, isto é, a CCDR sabe que ali não existe qualquer centro de interpretação do Guadiana, sendo de supor que tem acesso âs notícias e da página oficial do Portual2020, pelo que sabe da situação irregular:

    «temos a CCDR que veio cá inspecionar tudo o que foi esta candidatura e este imóvel, veio confirmar aonde é que os fundos estavam a ser aplicados e portanto aqui eu não tenho mais nada para dizer»
Concluindo:
  1. A presidente da autarquia bem como a CCDR Algarve sabem da situação irregular.
  2. Em 2014 a autarquia lançou um concurso visando a concessão do edifício para utilização turística privada, não estabelecendo quaisquer condicionalismos quanto à sua utilização.
  3. Em 2015 a autarquia assinou com uma empresa privada umcontrato de concessão de três edifícios, um deles o da Alfândega, a troco de rendas mensais, sem qualquer limitação quanto à sua utilização.
  4. Recuperado o edifício com fundos comunitários a autarquia nada fez para lhe dar o destino e logo que estava recuperado lançou o concurso visando a sua utilização como unidade turística, estando previsto inicialmente a instalação de suites de luxo e mais tarde um café com sala de fumo para charutos.
  5. Pelo que disse na reunião do dia 9 parece que a autarca não está muito empenhada em dar ao edifício o~um destino compatível co os fundos a que a autarquia se candidatou e utilizou: «Portanto, aquilo que nós temos é o seguinte, há fundos comunitários, que já falámos com a CCDR se poderíamos utilizar em termos particulares. Neste momento ainda não e, portanto, tem de decorrer um determinado tempo para que, há uma visita eu pedia ao engenheiro....»
  6. Há indícios de irregularidades muito graves na utilização de dois fundos comunitários que merecem ser averiguadas por quem de direito.
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Reprodução das declarações da autarca na sessão de Câmara de 19 de Março de 2019:

«Relativamente à casa de da Alfândega e se calhar eu penso que muitas vezes aqui o que nós estamos, eu já percebi que, agora aqui o que nos move é as notícias que surgem nas redes sociais mas eu terei aqui todo o prazer em vos apresentar esta questão e relembrar que este imóvel da alfândega foi um imóvel que já estava ali há muitos anos, é o primeiro imóvel de VRSA construído e que naquela altura nem o Estado, nem os anteriores executivos conseguiram adquirir este imóvel e que o anterior executivo, com todas as suas características, com todas as suas ou com todos os abusos que foram efetuados, com todo o dinheiro mal gasto que os senhores dizem, foi adquirido por 300.000€. 

A partir daí, houve realmente um processo, houve realmente um projeto que é o Adalbar Adabalagua ou o que é, que nós concorremos, o anterior executivo concorreu, tinha o valor de 150.000€, pois o teto estava a ruir e aquilo tem uma construção, que eu não sou arquiteta e não entendo, mas o que me dizem é que se o teto vai abaixo a construção vai toda abaixo e atualmente, com todas as idiossincrasias o que ia acontecer ali é que se este edifício não fosse arranjado Nessa altura e todos os funcionários que entraram lá verificaram o estado miserável em que se encontrava o edifício e o que aconteceu é que se procedeu ao arranjo desta cobertura.

Por outro lado, depois houve outra candidatura que tinha a ver com a interpretação do Guadiana, que tem ainda a ver com a interpretação do Guadiana e contemplava uma nova candidatura aprovada a fundos europeus para a recuperação de interiores e fachadas onde se escrevia que o imóvel iria ser um centro de divulgação e interpretação do Guadiana. 

Previa-se já gastronomia local, informação turística no rés do chão, salas polivalentes, salas de leitura. Polivalentes para quê? Convívio, leitura e suites para promoção nacional e exposição no piso um. Nesta data, salvo erro, eu tenho aqui o contrato, que eu posso-vos deixar aqui em sessão de câmara, aqui para constar em ata, nesta altura, o que é que nós tínhamos aqui é no âmbito da candidatura do programa operacional Algarve 21 eixo valorização do território e desenvolvimento urbano, um projeto dentro da reabilitação urbana, nesta altura já havia aqui o contrato onde quer o privado, quer neste caso a SGU concorreu com fundos comunitários para reabilitar este edifício que hoje se encontra aqui. Não há passagem, não há venda deste imóvel, tal como foi retratado aí nas várias vozes populares, não é?, tal como foi tratado portanto aqui não está a ver nenhuma venda. 

Temos fundos comunitários, temos a CCDR que veio cá inspecionar tudo o que foi esta candidatura e este imóvel, veio confirmar aonde é que os fundos estavam a ser aplicados e portanto aqui eu não tenho mais nada para dizer, ficarei à disponibilidade, ficarei à disposição das vossas questões, das vossas visitas, como várias vezes foram convidados os vereadores, os senhores não gostam de ser intitu intitulados de vereadores da oposição, mas digo eu vereadores sem pelouro para que pudessem visitar, aliás, o vereador Álvaro acho que já lá esteve e portanto o projeto foi efetuado com fundos privados da Grand e com fundos da SGU através das candidaturas quer a esta, quer ainda ao turismo de Portugal.» (Declarações da presidente da autarquia de VRSA na Sessão da CM do dia 19 de Março de 2019)

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LIGAÇÕES:
  1. Post O CAFÉ DA CASA DA ALFÂNDEGA (1)
  2. Podcast da Sessão da CM do dia 19 de março: Parte I, Parte II
  3. Podcast da Sessão da CM de 9 de março de 2019
  4. INTERREG
  5. Projeto ANDALBAGUA



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ANEXOS

  1. Programa do concurso "alojamento a céu aberto"
  2. Caderno de encargos do programa "alojamento a céu aberto"
  3. Decisão do juri do concurso
  4. Resolução do júri
  5. POCTEC - Territorio y Navegabilidad en el Bajo Guadiana - 0323_ANDALBAGUA_5_E
  6. Contrato Grand Algarve - SGU
  7. Apresentação do Projeto Andalbagua por Celia Rosell Martí, Coordinadora General de Acción Exterior en Junta de Andalucía
  8. REGULAMENTO (CE) N.o 1828/2006 DA COMISSÃO, de 8 de Dezembro de 2006, 
  9. Público - Fugas